Hoje, 4 de novembro, é o Dia da Favela. A data marca a primeira vez o termo que apareceu em um documento público, no ano de 1900, quando o delegado da 10º Circunscrição e chefe da Polícia do Rio de Janeiro, Enéas Galvão, se referiu ao Morro da Providência como favela, onde moravam os favelados, como eram chamados os soldados que lutaram na Guerra de Canudos, na Bahia, e ficaram marcados pela planta favela, muito comum no sertão nordestino. A associação feita na época foi como um lugar sujo e de gente imoral.

O Morro da Providência, no centro do Rio de Janeiro, é considerada a primeira favela do Brasil. No município do Rio de Janeiro, o Dia da Favela é lei desde 2006 e, no estado, desde 2019. Na capital paulista, a data entrou para o calendário oficial em 2015.

A presidente nacional da Central Única das Favelas (Cufa), Kalyne Lima, lembra que, mais do que comemoração, o dia é marcado por reflexão sobre os problemas enfrentados pelos moradores desses territórios e sobre a potência presente neles.

“A favela é um território muito fértil de valores. Valores humanos, valores de solidariedade, de união, e a gente compreende que essa corrente é a nossa principal tecnologia social, é a nossa principal estratégia de luta, de resistência, né? Hoje temos essa celebração, essa pauta, essa reflexão sobre esse território que é tão importante na geração da economia desse país. São mais de R$ 119 bilhões gerados por essa população através do seu trabalho, do seu esforço e da sua dignidade, através de tudo que proporciona para esses territórios e suas famílias” diz ela.

De acordo com Kalyne, o Brasil tem hoje mais de 14 milhões de pessoas vivendo em favelas. Segundo a estimativa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2019 havia 5,1 milhões de domicílios em 13.151 mil aglomerados subnormais no país, localizados em 734 municípios, em todos os estados e no Distrito Federal. Em 2010, havia 3,2 milhões de domicílios em 6.329 aglomerados subnormais, em 323 cidades, segundo o último Censo Demográfico.

Pandemia

Kalyne destaca que a pandemia de covid-19 aumentou as desigualdades sociais no país, impactando muito a renda familiar dos moradores de favelas. O que levou a uma grande movimentação de solidariedade envolvendo a sociedade civil e o setor privado para dar suporte a essas pessoas.

“São lugares, obviamente, onde as pessoas não conseguiram, dentro de seus lares, fazer isolamento social. Muitas vezes a estrutura é absolutamente inadequada, famílias muito numerosas em casebres muito pequenos. Através dessas iniciativas a gente tem levado assistência às famílias em 5 mil favelas brasileiras. Só em 2021, até o mês de agosto e setembro, a gente já tinha mobilizado R$ 400 milhões, revertidos em ajuda direta para essas famílias das mais diferentes formas. Desde o alimento propriamente dito, a cesta básica, distribuição de renda por meio da cesta digital, onde a mãe pode ter autonomia de compra, a chips de telefonia com acesso à internet, a botijão de gás, itens de limpeza, de higiene e de proteção”, explicou.

Agora, com o cenário epidemiológico melhorando, ela diz que as favelas passam por um sentimento de recomeço, mas com muito trabalho pela frente.

“Hoje a gente celebra o Dia da Favela também com esse sentimento de virada, de alívio sobre a pandemia, mas compreendendo que as consequências geradas por elas serão enfrentadas por toda a sociedade brasileira durante anos. A gente não consegue mensurar o que é reerguer um país que hoje apresenta mais de 50% de sua população enfrentando a insegurança alimentar. É um dado muito dramático”, observou.

Atos no Rio de Janeiro

A Cufa preparou eventos para marcar o dia 4 de novembro em todo o país. No Rio de Janeiro, haverá debates, palestras e show em homenagem ao sambista Arlindo Cruz, em Piedade, com participação de Dudu Nobre. No Museu de Arte do Rio (MAR), na Praça Mauá, foi inaugurada hoje a exposição Sua Arte Aproxima com os grafites resultado de um concurso promovido pela Cufa.

Também estão programadas atividades no Jacarezinho, Complexo do Alemão, Borel e no Morro do Sossego, em Duque de Caxias. O Instituto Data Favela está preparando uma pesquisa sobre as conquistas, transformações, reflexões e reparações alcançadas ou pretendidas por esses territórios.

A Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj) promoveu pela manhã a Marcha das Favelas por Direitos, saindo do Campo de Santana em direção à Assembleia Legislativa (Alerj).

O movimento comunitário reivindica o fim das chamadas troias, prática em que a polícia utiliza casas de moradores como base para tiros durante operações, por meio da aprovação do Projeto de Lei Kathlen Romeu; a instalação de câmeras nos uniformes e viaturas policiais; a reabertura dos restaurantes populares; a utilização dos recursos da privatização da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae) em obras de infraestrutura nas favelas fluminenses; o fim do reconhecimento fotográfico; e a continuação e Divulgação do Plantão do Ministério Público para controle externo das operações após a pandemia de covid-19.

Mutirão social

A Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos leva hoje o projeto Social + Presente Edição Favela, aos moradores dos complexos da Penha e da Mangueira, ambos na Zona Norte do Rio. A ação vai até as 15h na Rua Ardíria, na Penha, e na quadra da Escola de Samba da Mangueira.

O projeto oferece serviços como isenção de taxas para documentação básica, como certidões de casamento, nascimento e óbito, RG e CPF; informações sobre benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS); vagas de emprego para o público apenado; atendimento jurídico, psicológico e de assistência social para mulheres e pessoas LGBTQIA+; orientações sobre o direito de crianças, adolescentes e idosos.

Desde o início do projeto, em agosto, o Social + Presente atendeu mais de 3 mil pessoas com eventos organizados toda semana, tanto na capital quanto no interior.

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